sexta-feira, agosto 20, 2004

O horror indescritível

Da primeira vez que foi eleito, Bush recorreu a uma singela fraude eleitoral, nada de mais... É claro que qulquer pessoa sensata teria ficado absolutamente horrorizada e desgostada com o ponto a que chegámos nesta nossa suposta Democracia.

Mas agora... Agora, depois de todas as atrocidades, depois de todos os atropelos, depois de tudo aquilo que o Imperador Bush fez e disse, não fez e não disse, ele está perto de ganhar as eleições! Por causa de uma campanha de difamação contra John Kerry, supostamente financiada por G. Bush, a popularidade deste caiu e a de Bush aumentou. Resultado: segundo as sondagens, a intenção de voto em Bush, subiu dois pontos percentuais, ficando a apenas um ponto percentual de Kerry! Será isto possível? Não estou eu a ter um pesadelo?! Como é que se explica que aquele criminoso seja escolhido livremente pela quase maioria da população? Onde é que anda o bom senso dos americanos?

Açguém que me diga o que se passa, porque tenho a sensação de ter entrado na "Twilight Zone".

Prometeu

quarta-feira, agosto 18, 2004

Agora numa nota mais leve...

Olhem lá para a história da minha vida! :) Confessem lá que eu até tenho sentido de humor!!

Fraternalmente,
Prometeu

terça-feira, agosto 17, 2004

Energias - como renovar este maldito país?

PUBLICO.PT - Energias renováveis já são mais baratas

É com estupefacção que consigo ler coisas destas... Parece impossível como a nossa política de mesquinhice ignora coisas tão grandes! Querem cortar nas despesas, mas a dos combustíveis aumenta e ninguém faz nada... Sim, senhor, viva a tal continuidade que todos adoramos e prezamos! É com este tipo de inteligência governativa com que temos de lidar... os pobrezinhos são sobrecarregados de impostos e aqueles que realmente poderiam fazer alguma diferença passam impunes. Como é o caso da indústria energética...
E daqui a quarenta ou cinquenta anos, quando o petróleo escassear, quem o tiver (E.U.A.) será o dono e senhor do mundo. Contra factos (e inacção generalizada) não há argumentos!

Prometeu

"Manifesto contra o Trabalho"

"Manifesto contra o trabalho" foi um livro que, por acaso, comprei (ontem) e li (hoje). Da autoria do Grupo Krisis (alemão), mostra bastante bem a actual condição de escravatura em que os trabalhadores da suposta democracia em que vivemos se encontram. Procede também a uma análise da actual crise capitalista: o sistema está em ruptura e a única forma que tem permitido sustentá-lo é através da especulação bolsista, cujos ganhos se deveriam reflectir num aumento da prosperidade que, na verdade, não acontecerá. Por outro lado, há também a ter em conta a falha do Estado-Providência, com o triunfo do neoliberalismo. O problema encontra-se no endeusamento do Trabalho, que é tido como uma necessidade natural, quando é tudo menos isso. É contra isso que a rebelião se deve dirigir, contra o trabalho e contra a própria política, já que tal movimento se mostra antipolítico, no sentido em que conduz ao derrube do Estado.

Por fim "Já não será a finalidade autotélica do trabalho e do «emprego» a determinar a vida, mas sim a organização judiciosa das possibilidades comuns, as quais deixam de ser dirigidas pelo automatismo de uma «mão invisível», para passarem a sê-lo pela acção social consciente. A riqueza produzida será objecto de apropriação directa segundo as necessidades, e não em função do «poder de compra». Juntamente com o trabalho, desaparecerá a universalidade abstracta do dinheiro, tal como a do Estado. Em substituição das nações separadas surgirá uma sociedade mundial que já não precisa de fronteiras, na qual cada indivíduo poderá deslocar-se livremente e contar com o universal direito de permanência em qualquer lugar."

São 9€ (na FNAC) bem gastos, e quem também já leu o livro por favor comente e acrescente. Quem ainda não leu, é favor ir a correr comprá-lo! Têm também o link para o site em português do Grupo Krisis.

Prometeu

segunda-feira, agosto 16, 2004

Sobre a Educação

Antes de mais, e para poderem perceber este post, têm que ler (na íntegra, de preferência), este artigo.

Depois disso feito, vou deixar algumas considerações.
Não, não discordo dela, não discordo das opiniões que já partilho há muito, mas há que discernir aqui algumas coisas, de forma a que também não se cometam injustiças para os poucos que procuram ainda aplicar-se nas nossas escolas. Em primeiro lugar, os fundos que a Educação recebe são, de facto insuficientes. Não nos podemos esquecer que usufruem destes fundos tanto os que trabalham como os que não trabalham, especialmente no que se trata de infra-estruturas e material de apoio. Considere-se também que o que aocntece é uma grande falta de sapiência na atribuição dos fundos. Porque não institucionalizar, por exemplo, uma bolsa de mérito também a partir do 5º ano? Esta não pretende aumentar o sucesso escolar (esqueçam lá essa demagogia, por favor - quem não consegue estudar, não consegue, ponto final!) mas sim recompensar quem de facto se esforça.
Em segundo lugar, o stress existe, é real, mas pode ser dividido em dois tipos: o stress de quem não trabalha e depois, quando chega a altura das avaliações, fica perturbado pelo mau resultado; e o stress de quem trabalha, a quem é exigido muito mais do que aos outros e que, no fim, são (mal) avaliados pela mesma escala que os outros...

Eu poderia alargar-me sobre isto, mas penso que, fora isto, o artigo daquela Professora mostra bem a realidade do Ensino Portguês.

Prometeu

sexta-feira, agosto 13, 2004

Ainda sobre a Europa e o Cherne

Ora bem, quero referir que, para além do facto que eu já considerei noutro post, ainda me chegaram às mãos informações deveras interessantes, que mostram que o nosso país realmente deveria ter sido afundado por um qualquer terramoto que nos separasse do resto do continente. Deveríamos já ter passado à história, num golpe teatral do género Atlântida... mas não, aqui ficámos e cada vez mais podemos enterrar as nossas cabeças com vergonha daquilo que em nome dos Portugueses é feito, cá dentro e lá fora! Bom, mas isto tudo só para referir um e-mail que recebi, e que dizia o seguinte:

"Vejamos o processo de nomeação do futuro presidente da UE.>>>>
1.- A UE tem 25 Estados membros. Mas como desses apenas 12 participam em todas as politicas da UE, o presidente da Comissão Europeia só pode ser escolhido entre 12 e não entre 25.
2.- Desses 12 Estados membros há 3 (França, Itália, Bélgica) que são excluidos pois já tiveram um presidente da comissão no passado. Ficam apenas 9.
3.- Desses 9 Países há 5 (Alemanha, Espanha, Holanda, Irlanda, Grécia) que ficam excluídos à partida pois já detêm cargos de relevância na UE. Ficam 4 Países.
4.- Dos 4 Países que ficam, foi convidado oficialmente o primeiro ministro do Luxemburgo, que recusou o cargo alegando que tem um compromisso com o eleitorado do Luxemburgo. Ficam portanto três Países: Austria, Finlândia e Portugal.
5.- Uma das imposições para se ser presidente da comissão europeia é falar Inglês e Francês. Ora mais de 99% dos Austriacos e dos Finlândeses não sabem falar Francês e Inglês. Restava pois Portugal. Como de costume no último lugar e por exclusão de partes. E ainda há entre nós quem diga que é uma honra Portugal ocupar este cargo. Se a saloice matasse, Portugal seria um cemitério de saloios."

Bom, de facto o nosso amigo Cherne tinha grandes razões para sair:
1 - Estava com a corda ao pescoço aqui em Portugal;
2 - Era o pau-mandado perfeito para os grandes senhores que o puseram lá;
3 - Melhor que tudo isto, era, aparentemente, a única opção verdadeiramente disponível...

É verdade que ninguém que esteja são da cabeça sente a falta dele, mas também é verdade que estas coisas são nauseantes... (Do mal, o menos - pelo menos não sou americano, penso que a vergonha me levaria ao suicído ou à insurreição!)

Prometeu

Post scriptum - O debate sobre The Matrix, Fahrenheit 9/11 e Super Size Me continua mesmo aqui em baixo... Deixem os vossos comentários!

terça-feira, agosto 10, 2004

Cypher e os problemas em "The Matrix"

Bem, já que me lancei na senda do comentário de filmes, primeiro com "Fahrenheit 9/11" e depois com "Super Size Me", resolvi continuar com mais um filme, mas desta vez afastando-me um pouco da análise das deturpações políticas actuais, se bem que é bem verdade que podem ser (e já foram) estabelecidos paralelismos entre "The Matrix" e a obra/ideologia de Karl Marx. Porém, neste caso não venho propriamente analisar essa vertente, e sim os aspectos epistemológicos e éticos presentes no filme e que são questionados partindo das acções da personagem Cypher, mas que englobam uma análise que compreende os três filmes, ao invés de se cingir à informação veiculada no primeiro.
Cypher e os problemas do filme Matrix

Desde logo, o filme apresenta uma ilusão que contrasta com uma realidade, uma forma de controlo que se opõe a uma libertação. Em suma, o mal e o bem. De facto, e estabelecendo o paralelismo com outras fontes que fornecem o background para a história do filme, é essa ideia de liberdade que é defendida: os humanos precisam de se libertar da ilusão e da opressão, para poderem ser verdadeiramente livres e poderem saber o que é real, o que é não-ilusório; o mesmo segue para A alegoria da Caverna de Platão e outras influências filosóficas. O filme pretende assim despertar a assistência e levá-la a questionar sobre aquilo que a rodeia. Porque, afinal de contas, não existe maneira de sabermos se estamos, de facto, numa simulação do género Matrix! Qualquer pessoa que queira provar logicamente e sem sombra de dúvida que não estamos todos enfiados em tanques e a nadar numa versão sintética do líquido amniótico vai ser certamente acometida de fortes dores de cabeça, porque um dos pontos mais brilhantes do filme é o facto de não oferecer qualquer escapatória e ser (por muito difícil que seja de acreditar) verosímil, palavra que aplico num sentido estrito e não lato (a verosimilhança de que falo está mais enquadrada no conceito de plausibilidade, mas, de alguma forma, ultrapassa-o); o mesmo se aplica a Morpheus, ele pura e simplesmente não pode saber se está ou não no mundo real mesmo depois de ter saído da Matrix (apesar de nos ser dito que esta crença é, afinal de contas, correcta, ele não o pode saber porque não tem a omnisciência do espectador). Eu não creio estar numa matriz computorizada, mas não posso provar que não estou. Por outro lado, não posso provar que estou, mesmo se cresse nessa possibilidade. Faz-me lembrar um pouco os debates científico-teológicos sobre Deus(es)... O que não deixa de ser engraçado é que Descartes (outra das bases ideológicas do filme) afasta a sua dúvida sobre se ele ou mesmo o Mundo existem com a existência de Deus, que, repito, se torna difícil de comprovar! É claro que ressalvo desta verosimilhança algumas pequenas (e daí talvez não tão pequenas) incongruências de hardware e software que existem no filme – ninguém é perfeito... Portanto, muito tendenciosamente, mas sem qualquer espanto, o espectador é conduzido a tomar o partido dos “bons” e a rejeitar sumariamente o ponto de vista dos “maus”. O que leva a que, quando Cypher se senta à mesa com o Agente Smith a discutir os termos da traição dos seus amigos de longa data, o espectador se sente enjoado, perguntado talvez “Como é possível?! Ele quer voltar?! Estará louco?!” Ora, esta questão, que já parece arrumada (em virtude da fé exagerada nos juízos empíricos que muitas vezes fazemos), tem, na verdade, três vertentes: a vertente ética, a vertente hedonística e a vertente ideológica que se pode extrair da posição de Cypher, muito embora o próprio não partilhe dela (ou pelo menos o filme não o demonstra).

Ética na posição de Cypher

Este ponto não deixa grandes dúvidas. Qualquer pessoa (no sentido filosófico de “pessoa”, como alguém que não vive só para si, que tem e pratica a empatia e a praxis) tremerá de nojo ao verificar que Cypher vende os seus amigos muito simplesmente porque está farto de viver fora da Matrix (e de comer aquela mistela sintética que servem na Nebuchadnezzar: olhem como se delicia com o bife!). Esta acção é completamente anti-ética, já que, concordando ou não com as opiniões dos seus amigos sobre a Matrix, não tem o direito de sacrificá-los e menosprezá-los, privando-os do direito a exercer a sua liberdade e a seguir um plano ético e vivencial próprio. Cyoher está apenas a obedecer aos seus próprios interesses, sem tomar em consideração o que quer que seja. Eticamente, a atitude dele é condenável e essa é a principal razão pela qual os espectadores negam terminantemente tudo aquilo que Cypher diz. Julgam-no mesmo louco. Não ponho a sua insanidade mental em causa, mas existem outros aspectos que merecem ser considerados e que não o podem ser se nos limitarmos a ignorar o que Cypher diz.

Hedonismo na posição de Cypher

A posição de Cypher é claramente hedonística: apesar de saber que o bife não é real, delicia-se com ele, quase parece querer encará-lo como real (e notoriamente considera-o melhor que a já referida mistela sintética do mundo real). Mais tarde, ao falar com Trinity quando esta ainda está na Matrix e ele está na realidade, ele defende que a Matrix pode ser mais real do que o mundo real. Isto demonstra sem dúvida que, para Cypher, a realidade se prende com a satisfação posterior: quanto mais satisfação se obtiver, maior é o grau de realismo (ou de realidade, neste caso) – hedonismo, portanto.
Claramente ele preocupa-se apenas consigo próprio uma vez mais e a sua posição egoística leva-o a este ponto de vista que certamente não será do agrado (intelectual) dos espectadores: a realidade, assim o cremos, tem uma existência independente da finalidade para a qual é utilizada e não depende do grau de satisfação do sujeito.

Então, estamos exactamente no mesmo sítio onde estávamos antes de ter começado a minha análise! Condenamos a sua falta de ética e de princípios humanos e condenamos o seu desejo de prazer que se conjuga com o sacrifício de tudo a isso e a uma concepção adulterada do que é real.
Mas, na verdade, resta a análise ideológica que Cypher não partilha mas que se pode retirar da forma como ele age.

A ideologia que se pode extrapolar

Tal como eu disse no início, a Matrix é considerada condenável porque nos priva da realidade e do saber real e porque nos priva da nossa liberdade como agentes de acção. E agora eu pergunto: será isto realmente assim?
Na maioria dos ensaios de filosofia que li sobre o Matrix (e não foram poucos) e em que se fala de problemas epistemológicos, existe uma preocupação central, a par da de Platão e Descartes: aquilo que percepcionamos pode não ser real, o que implica que estamos iludidos sobre o mundo e sobre o que nos rodeia: somos incapazes de conhecimento de facto se nos basearmos apenas nos sentido (e até mesmo a Ciência seria criticada por Descartes, que gostava de criticar tudo – absolutamente tudo), excepção feita aos elementos matemáticos e geométricos, imutáveis e sempre verdadeiros, quem em Descartes quer em Platão.
Na Matrix podemos ver claramente (e daí talvez não) como eles estão enganados sobre a realidade: passam a vida mergulhados num líquido viscoso com o sistema nervoso central e periférico ligado a um super-computador que lhes dá a aparência de terem experiências e de viverem. Existem apenas “sinais eléctricos interpretados” por um cérebro, como diz Morpheus a Neo no Construct. Assim, e segundo muitos filósofos que se debruçaram sobre este problema, existe um erro total na concepção da realidade, e que, ainda por cima, é massificado. Interessantemente, considero que esta afirmação é verdadeira em dois sentidos mas fundamente falsa em outros dois, um deles o mais importanto de todos os quatro.
Na Matrix podemos ver claramente (e daí talvez não) como eles estão enganados sobre a realidade: passam a vida mergulhados num líquido viscoso com o sistema nervoso central e periférico ligado a um super-computador que lhes dá a aparência de terem experiências e de viverem. Existem apenas "sinais eléctricos interpretados" por um cérebro, como diz Morpheus a Neo no Construct. Assim, e segundo muitos filósofos que se debruçaram sobre este problema, existe um erro total na concepção da realidade, e que, ainda por cima é massificado. Interessantemente, considero que esta afirmação é verdadeira em dois sentidos mas fundamentalmente falsa noutros dois, um deles o mais importante de todos os quatro.
0 primeiro sentido em que esta afirmação é verdadeira é o mais óbvio: percepcionam prédios, carros, etc... quando na verdade estão dentro de um mundo cibernético onde toda a realidade não passa de combinações de zeros e uns. Portanto, nao existe a adequatio res et intellectus, já que a res (código binário) não é percepcionada como tal, os sentidos dos encarcerados não os põem em contacto com a realidade que os rodeia (a Realidade Virtual (RV), entenda-se). Porém, algo se insurge contra isto, tomando a afirmação não tão verdadeira quanto isso... Nós (presumindo que estamos em contacto com a Realidade Real (RR)) também não percepcionamos os átomos e moléculas como átomos e moléculas. Percepcionamos as coisas como gestalts, conjuntos mais significativos do que a soma das suas partes. Assim, os habitantes da Matrix podem não percepcionar o código binário mas percepcionam as gestalts, as formas resultantes e ao mesmo tempo excedentes dessas combinações de códigos binários (para que se possa perceber melhor, chamo a atenção para a visão de Neo da Matrix depois da segunda ressurreição; ele vê apenas linhas de código informático, vê apenas os elementos constituintes básicos e não percepciona - directamente, porque ele percebe esses constituintes e agrega-os mas não os percepciona agregados da forma convencional - as gestalts daMatrix). Assim, apesar de não saberem a verdade sobre o seu mundo de RV (o que é incontestável), percepcionam as gestalts da RV. Estão equivocados em relação à realidade da Realidade que percepcionam, mas percepcionam essa mesma Realidade, estando portanto em contacto com ela.
0 segundo sentido prende-se com a RR (o mundo que existe fisicamente fora da Matrix) e que é a parte mais importante. Estando eles encarcerados dentro da Matrix, é impossível que percepcionem a RR. Até aí é verdadeiro. Porém, o que se costuma dizer é que, porque não percepcionam a RR, as suas crenças sobre a RR estão erradas porque são baseadas nas experiências da RV e que as crencas sobre a RV estão tambem completamente equivocadas. Ora, isto já não é bem assim! Na verdade, e por estranho que pareça, é por percepcionarem a RV como sendo RR que eles possuem conhecimentos correctos (na medida do possível) sobre a RR. Não se pode dizer que existem erros massificados quando, na verdade, tudo o que eles sabem se aplica à RR! Se um físico quântico saísse da Matrix, não precisava de aprender tudo de novo, nem de esquecer o que tinha aprendido, porque tudo se aplicaria na perfeição. Isto porque a RV é uma simulação (quase) perfeita da RR, permitindo aos sujeitos ter a experiência da RR na RV. É claro que em termos históricos e de realidade física (ao invés da realidade do funcionamento inerente à natureza) existiriam erros crassos, o que não permite dizer que todos os conhecimentos dos ligados à Matrix estão equivocados. Como acabei de dizer, o subjacente (as leis naturais) e muitas outras coisas (Filosofia, Sociologia, etc...) estão completamente correctas. Aliás, vou mais longe: com tanta guerra em Zion, será que eles possuem tanto conhecimento como os cientistas da Matrix?
Em suma: ao percepcionarem a RV, conhecem a RR, estando os seus conhecimentos certos em relação à RR e incorrectos em relação à natureza das percepções da RV. Existem duas realidades, percepcionam e estão em contacto com uma, pensando que é a outra. Porém, tudo o que sabem da RR também se aplica à RV, simplesmente mudam as partes que compõem aquilo que se percepciona como uma mesma gestalt. Na RV, a gestalt ''carro" é composta por bits mas é mais do que os próprios bits; na RR, a gestalt "carro" é composta por partículas sub-atómicas mas é mais do que as próprias partículas. Uma mesma gestalt, com duas origens. Ambas se comportarão da mesma forma em ambas as realidades!
Agora que já foi visto o problema da realidade, resta ainda o problema da liberdade.
Segundo é opinião corrente, os seres humanos, porque estao aprisionados (física e mentalmente) na Matrix não são livres. Portanto, precisam de se libertar da Matrix para poderem ser livres, para poderem ser agentes das suas acções. Na minha análise actual deixarei de fora os princípios deterministas que surgem no filme, ja que o assunto do Destino (e consequente liberdade ou não do sujeito) é abordado de duas formas contraditórias: por um lado existe um futuro que, até certo ponto está escrito e que leva a que certos acontecimentos tenham lugar "inexoravelmente" (como diz o Arquitecto); mas, por outro lado, "o problema é a escolha", como Neo e a Oráculo dizem muitas vezes, o que obriga a que exista um agente livre que escolha e que impede a existência de um Destino já traçado.
Ater-me-ei à análise da frase destacada. Ora, é claro e inequívoco que existe uma forma de controlo, uma forma de prisão, já que os humanos não escolheram ser ou não inseridos na Matrix, simplesmente foram-no de forma arbitrária. Neste aspecto, os humanos perdem alguma da sua liberdade. Mas isto não implica que os sujeitos não tenham liberdade! Isto não implica que não exista livre-arbítrio e responsabilidade a par das acções dos sujeitos. Muito simplesmente, eles não têm liberdade dentro da RR. Se analisarmos a RV, vemos que afinal a liberdade ainda existe!
Os sujeitos dentro da Matrix fazem o que querem, quando querem e como querem, com respeito às limitações também existentes na RR e portanto irrelevantes para o caso! Se as máquinas Ihes dissessem ou os obrigassem a fazer isto ou aquilo, admitir-se-ia que não existia liberdade, porém, o caso não é esse: dentro da Matrix, os indivíduos são agentes, têm liberdade, são responsáveis pelas suas acções e podem (ou não) agir de acordo com os princípios que partilham. Exactamente da mesma forma que na RR. Não obstante isto, existem algumas coisas que realmente limitam a liberdade dos inseridos na Matrix e que não existem na RR: quando um Agente se apodera do corpo de alguém e o utiliza, ou quando uma Era da Matrix chega ao fim e as máquinas fazem reset ao sistema, não permitindo o avanço natural da História. Fora estas excepções, todos os que estão dentro da Matrix são livres, livres segundo as regras da sua própria Realidade. É claro que existiria um grau muito maior de liberdade se Ihes fosse dado a escolher se queriam ou não estar na Matrix (que é como acaba o terceiro filme).
E se essa escolha estivesse disponível? Pessoalmente, quereria ficar dentro da Matrix, e nem pensaria terceira vez! No caso de uma Matrix benevolente (do género que se começa a formar no fim do terceiro filme), não existiria provavelmente a necessidade de Agentes, nem de andar a fazer reset ao programa. E, considerando o estado do planeta, viver-se-ia em liberdade e em realidade dentro da Matrix. Para além do mais, esta é uma ligação tecno-simbiótica que faz todo o sentido: as máquinas cuidam de nós e nós cuidamos delas. Qual é o problema? Acrescente-se a isto mais uma coisa: quem viu o DVD “Animatrix” pode constatar que a culpa da guerra foi dos humanos. Fomos nós que quisemos destruir as máquinas, e elas indulgenciaram muitos abusos da nossa parte! Elas, tendo necessidade da nossa bio-energia, puseram-nos dentro da Matrix. Mas, de certa forma, também precisamos delas! Zion funcionava à base de máquinas, como o conselheiro Hamman bem demonstra a Neo; entre umas e outras, prefiro ficar na segurança e no descanso da Matrix, que fornece muito mais do que a RR, a todos os níveis que se possa imaginar. Que importa que eu não controle o meu corpo? Só através do cérebro sei que tenho corpo, portanto, a partir do momento em que eu pense e possa controlar um corpo, mesmo que virtual, sou livre de agir. Mesmo a quem contrapõe que nós queremos efectivamente fazer as coisas e não só ter a experiência de as fazer (como Robert Nozik), eu respondo que isso é uma questao que não existe: eu só sei que tenho as experiências que tenho pela percepção e razão, ora, se tudo isso esté no que é passado para o avatar da Matrix, não existe diferença detectável entre percepcionar uma experiência de forma virtualmente completa (como na Matrix) e ter a mesma experiência na RR! Basta poder escolher para escolher não me rebelar contra o sistema! "0 problema é a escolha", de facto!
Porém, devo concluir dizendo que este ponto de vista se aplica apenas ao carácter prático da Matrix. Toda a ideia de libertação da ignorância a que o filme incita é perfeitamente justificada para nós, como metáfora.

Prometeu
P.S. - Para mais informações e muitas páginas de ensaios de filosofia, consultem "What is the Matrix", site oficial do filme. Para além do mais, apreciaria quaisquer dúvidas/críticas sobre este ensaio ou tudo o relacionado, bem como sugestões sobre como o tornar um pouco mais acessível...

domingo, agosto 08, 2004

Comam que faz bem... Comam! Não comem?! Olhem que são invadidos!!

Sim, o problema do Iraque devia ser o facto de não terem assim grande representação das multinacionais da comida rápida (também conhecida como "junk food"), em especial da McDonald's... Nós temos de comer cada vez mais junk food para ficarmos saudáveis (o que significa estupidificados, gordos e preguiçosos)!

A provar esta coisa tão simples encontra-se um novo documentário, que eu me atreveria a mencionar como primo do "Fahrenheit 9/11", que se chama "Super Size Me", e que retrata a amarga realidade (interna) dos comedores de McDonald's. Neste filme, em que o realizador é também o principal protagonista, vemos como esta comida - que a própria McDonald's diz ser saudável - afecta o nosso organismo. O que se passa é o seguinte, o realizador documenta-se a si próprio, já que toma a decisão de comer McDonald's 3 vezes ao dia, todos os dias, por um mês! Até parece algo insípido, não parece? Mas o melhor é que ele foi também ao médico fazer análises, e aí a coisa torna-se mais interessante... Sim, porque no fim da experiência, ele faz umas análises, que mostram que os níveis de colesterol dispararam (sem supresas, claro) e que ele quase morreu devido a sinais de princípio de falência do funcionamento do fígado. Ei, se quiserem ficar com a herança de alguém perfeitamente saudável, McDonald's p'ra cima! Adicionalmente, fontes científicas já informaram que os hamburgers vendidos têm um inibidor de saciedade. Ou seja, a pessoa já não necessita de mais comida, mas a detecção desse mesmo facto fica inibida por acção da própria comida, o que leva a que a pessoa coma exageradamente! Agora a sério, quem é que quer lá voltar? Ah, e pairam rumores de que aquilo é carne de búfalo importada dos E.U.A.! Pensavam que estavam a comer porco? Vaca? Não, se os rumores forem verdadeiros orgulhem-se de estar a comer búfalo!

Peço desculpa mas agora tenho de ir comer alguma coisa que não me mate!

Prometeu

O Primeiro Ministro tem que descansar

E aqui estamos nós, com quase três anos de governo... não, esperem... ah, quase me esquecia de que ele ainda não está lá sequer há dois meses... Mas claro, tem que tirar férias na mesma! E não pode haver barulho por perto! É por isso mesmo que as obras que se encontram perto da casa do senhor PM têm de parar. Afinal de contas, o que é mais importante, o desenvolvimento imobiliário que gera riqueza ou o descanso da mui fatigada cabeça daquele gentil e pacífico senhor, por todos nós adorado? As férias no algarve não podem ser prejudicadas!

E agora que penso mais profundamente na questão, não posso deixar de estabelecer um paralelismo com outro tipo que eu adoro... o nosso amiguinho G. W. Bush (desculpem-me mas acabei de sentir um calafrio)! Sim, ele, que passou cerca de 40% do tempo antes do ataque de 11 de Setembro na sua quinta do Texas, a fazer de conta que trabalhava! Trabalhou tanto que caíram 4 aviões do céu sem que ninguém fizesse nada (graças aos céus). Assim se prova que os alunos conseguem sempre aprender com os mestres. Apesar de numa escala mais pequena: o nosso querido Santana Lopes contenta-se com uma vivenda, enquanto que o nosso ditador favorito prefere logo uma enorme quinta...

Para mais informações vão aqui. Aliás, se forem pessoas interessadas por defender realmente as ideas que são necessárias e das quais temos um défice, aconselho-vos esse mesmo blog, que se chama "Tá de chuva" a par do já referido "o uno e o múltiplo"!

Prometeu

quinta-feira, agosto 05, 2004

Fahrenheit 9/11

Tive finalmente a oportunidade de conseguir ver o filme, que tirei da Internet (alimento a indústria do cinema o menos possível) e penso que está ainda melhor do que aquilo que os boatos queriam fazer passar.
Primeiro, tenho de referir o singelo facto de que o filme foi censurado e estão a ser postos entraves à sua distribuição comercial no país da "liberdade" - nos E.U.A. É ou não é bom ter um país destes a defender a liberdade de expressão?

Em segundo lugar, aqui se prova que, tal como Marx muito bem tinha afirmado, são os poderes económicos quem realmente controlam a política mundial. Basta atentar nas relações comerciais que existiam entre a família bin Laden e a família Bush, todos os financiamentos de dinheiro saudita que estão neste preciso momento nos E.U.A. e todas as regalias que foram dadas a quem não as merecia. Como é referido, apenas um senador tem um filho no Iraque, e todos os que apoiam a guerra se recusam a enviar para lá a sua própria prole. É preferível que sejam as pessoas dos bairros mais pobres e carenciados que sejam alistados, que morram por uma pátria e por uma ideologia que não percebem e que os atraiçoa. Tudo o que se encontra demonstrado naquele filme demonstra o horror inumano do grande ditador Dinheiro e a estupidez implacável de certas pessoas que se deixam levar pelas falinhas mansas de quem está à frente de um cargo. Considero abominável e desprezível toda e qualquer pessoa que tenha a coragem ou o desplante de apludir George Bush, o Subserviente por um segundo que seja.

Muitos são aqueles que nos acusam de teorias da conspiração, alegando que o poder económico e político estão saudavelmente separados e que ao Estado cabe apenas a função de fiscalização, e que o poder político tem primazia. Se assim é, porque é que Al Gore não ganhou as eleições? Se assim é, porque é que se pode ver um grupo restrito de grandes industriais a discutirem o futuro da exploração do Iraque, porque é que por detrás de uma decisão política se encontra uma jogada económica?

Tudo o que podemos sentir é nojo perante tais coisas. Mas também pode ser que desperte em nós uma vontade de tentar alterar a situação. E é isso que se pretende. Pretende-se denunciar as mentiras e as ligações obscuras que se estabelecem longe dos olhos do público, e que podem perfeitamente ser usadas para explicar as reais intenções por detrás das acções.

Se mais alguém quiser referir alguma parte do filme e/ou comentar sobre ele, por favor faça-o, de forma a que as interpretações e o conhecimento se espalhem e consigam combater a ignorância.

Prometeu

domingo, agosto 01, 2004

Sobre a História dos fracos

Como é normal dizer-se, dos fracos não reza a História, que é feita dos sucessos e insucessos dos grandes e poderosos. São estes que, concepção geral, fazem avançar a História! Porém, e como já dizia num poema Bertold Brecht, «Em cada década um grande homem./Quem pagava as despesas?»
Assim é. Durante toda a História, os grandes pugnam por não serem esquecidos, tentam de todas as formas libertar-se «da lei da Morte». O que acaba por acarretar o resultado sobejamente conhecido: os reais praticantes de todos esses feitos fantásticos (os «fracos»), caem no mais completo esquecimento. Os grandes têm como tendência inscreverem os seus nomes nos anais da História, olvidando-se os que estiveram por detrás dessas conquistas. Só explorando os mais fracos é que os fortes conseguem sê-lo. Por outro lado, aqueles que têm a seu cargo os ditos anais da História acabam por contribuir para isso, menosprezando o papel dos explorados na criação das grandes obras.
O que depois acontece não é difícil de adivinhar: os mais fracos acabam por se habituar a essa posição de total subserviência, e não mais desejam fazer sentir a sua força por detrás dos números. É pena que os fracos tenham perdido a consciência da dita força; por outro lado, os poderosos nunca puderam esquecer este potencial problema: desde o «pão e circo» dos Romanos até formas mais modernas de controlo (Religião, Comunicação Social, etc...), os poderosos sempre pugnaram pelo apaziguamento das massas para que o seu poder não fosse subitamente abalado.
Então, porque nos queixamos da nossa impotência, quando estamos mergulhados num potencial enorme de poder, seja ele de que tipo for? Muito simplesmente porque «os fracos» preferem esquecer, de forma mais ou menos voluntária, aquilo que possuem. Por comodismo, encostam-se à sombra daquilo que os mandam fazer e demitem-se das suas responsabilidades, a não ser quando algo os afecta directamente.
Se passarmos em revista os principais momentos da História, vemos que os grandes nada fizeram senão manipular aqueles que, na escala social por eles instituída, se encontram abaixo deles. Por outro lado, este poder de controlar encontra-se nos que são controlados, já que são estes que reconhecem e cooperam com os opressores. Até onde teria avançado Alexandre, o Grande se estivesse sozinho? Se o seu exército se tivesse rebelado, Alexandre não teria sido, de todo, Grande! Actualmente existe um novo desporto: as manifestações ao velho estilo «democrático», estilo esse que passou completamente ao lado da influência directa dos tais fracos. A palavra «democrático» está entre aspas porque esta é uma expressão verdadeiramente difícil de explicar: o «demos» (povo) manifesta-se contra o «krátos» (poder), que, teoricamente, controla. É problema meu ou isto encerra uma contradição implícita: o povo manifesta-se contra si próprio? Essas demonstrações são, nos seus moldes actuais, dignas de nota por uma característica predominante: regral geral, são inconsequentes, pelo menos no que realmente interessa (transformações de fundo). Temos, como exemplo, as greves dos estudantes universitários: o que é que eles estão a fazer, a brincar às greves e às manifestações?! Quando se decidem por agir de uma forma que tenha real impacto? E isto é só um exemplo entre muitos outros disponíveis. É porque se acomodam, porque reconhecem um poder falsamente superior, e porque não sabem fazer-se ouvir, que as massas são tão duramente exploradas. Nada conseguirão fazer enquanto não se aperceberem de que o potencial de mudança lhes pertence. Sempre serão rechaçados enquanto se recusarem a enfrentar a simples realidade: que dos fracos não reza a História porque eles não querem que tal aconteça, porque se contentam em olvidarem-se do que é tão claro!
Para além do mais, existe um facto muito interessante: o carácter em espiral da História é quase sempre deixado de lado. É verdade que a História pode apontar, através do passado, caminhos para o futuro, mas também é verdade que a História é completamente menosprezada e esquecida, quando se trata de tomar decisões importantes! Porquê? Porque é que se ignora um elemento tão precioso? Para além do mais, a História que passa (e isto junta-se à ideia que desenvolvi atrás) é escrita pelos vencedores, falta-lhe uma imparcialidade que seria essencial para que se compreenda tudo. As influências de quem ganha sobre quem perde, quando chega a altura de escrever os manuais de História, é visível! Em último lugar, esta própria História dos vencedores é uma História de líderes, de seguidores e de super-homens, que remete para a obediência a alguém superior, capaz de liderar todos os outros. É este o tipo de seguidismo que desejamos? É para isto que tantas lutas foram travadas?
Reconheça-se, porém, crédito aos «fortes»: os meios empregues para que os «fracos» se esquecessem do seu real papel tiveram um grande sucesso! Nada conseguiremos fazer, nada poderemos alcançar, até que os reais detentores desse poder potencial, de que falei, se resolvam a utilizá-lo, para melhorar uma situação que todos sabemos estar mal. As contribuições não podem ser coniventes com o sistema, têm que o abalar, que o alterar de uma forma que seja inusitada. É necessária a reformulação de uma falsa consciência de classe, que está doente e moribunda, devorada por um cancro invisível, por uma doença neuro-degenerativa que poucos diagnosticaram. Para este cancro, a única solução é a remissão espontânea. Não, perdão, não pode ser espontânea, tem de ser planeada, tem de ser uma remissão naturalmente provocada!
Última questão: afinal, qual é o interesse de entrar para a História? No fim de contas, não somos senão sombras e pó.

Casamento e poligamia - relações interpessoais revistas

Esta ideia já me tinha surgido há bastante tempo, mas só agora decidi passá-la do meu computador para os vossos. Fui em grande parte motivado inconscientemente pelo blog http://ounoeomultiplo.blogspot.com/, a quem presto o devido tributo, aconselhando a sua leitura diária como forma de enriquecer o espírito. Eu próprio sou um comentador assíduo d' O uno e o múltiplo. Isto porque num dos posts se fala do conformismo; e já demonstrei aqui que sou perfeitamente anti-conformista, pelo que este assunto calha mesmo bem. Quero apelar a todos vós para que deixem os vossos comentários, as vossas opiniões e críticas construtivas, às quais tentarei responder da melhor forma possível. Desde já os meus agradecimentos.

Vou passar agora à análise de um problema que poucos vêem como tal, já que este está tão embrenhado no tecido social que nos rodeia e é tão pouco questionado (e ao mesmo tempo tão desobedecido) que poucos são os que se apercebem de que constitui uma prática anti-natural e profundamente contraditória, geradora de problemas e de perturbações para os que são expostos às nefastas consequências deste mal social. Falo, como se denota pelo título, da monogamia.
A monogamia tem tradição ancestral na sociedade ocidental e, muito por influência dos padrões religiosos, tem sido mantida como algo normal e natural, sendo que se pode considerar que não é uma coisa nem outra. Em primeiro lugar, basta atentar no reduzidíssimo número de animais que mantêm, de facto, relações monógamas: a probabilidade de que fosse natural (biologicamente falando) os homo sapiens sapiens terem apenas relações monógamas é ínfima... Podemos também olhar para outras culturas, em que existem haréns e organizações de géneros diferentes do costumeiro homem/mulher (não que eu seja defensor deste tipo de “uniões”, uso-as apenas como exemplo). Ora, é para mim claro que esta escolha cultural radica na negação do prazer a que fomos sujeitos por acção maioritariamente religiosa! Não é o cristianismo a negação de todo e qualquer prazer, de um ascetismo ridículo e levado a um extremo quase insuportável para o humano? Por transmissão cultural e ideológica, todos somos habituados a que um homem se junte com uma mulher, e a que aí terminem as possíveis combinações de interacções sexuais permitidas... Porém, muito estranhamente, o fenómeno da poligamia tem vindo a tornar-se algo que se olha com cada vez maior indiferença, com o pequeno problema de que não se lhe chama poligamia, mas sim traição conjugal. Cada vez mais as pessoas que têm “casos”, como é vulgar dizer, são vistas de forma menos discriminatória, ou seja, a poligamia não está a ser aceite mas está a ser cada vez mais tolerada, porém, não é correctamente adjectivada. Como é claro, só quebrando algumas barreiras do estabelecimento e aplicação de conceitos é que se consegue romper com o politicamente correcto. É politicamente correcto horrorizarmo-nos perante o mero pensamento de poligamia, mas quando se ouve falar numa história de traição (e obrigatório comportamento polígamo) encolhem-se os ombros dos mesmos ouvintes. Interessante contradição – porque será que as pessoas se deixam guiar pelo politicamente correcto, porque será que é o conformismo tão querido à normalização que rege a mentalidade comum? Repare-se que muitas relações se deterioram porque uma das partes (ou mesmo as duas) se saturam. A saturação é consequência directa da exposição de duas pessoas uma à outra durante um espaço de tempo demasiadamente grande. Da mesma forma que a tudo o humano se habitua, como é costume dizer-se, também não é menos verdade que depressa o ser humano se enfada de quase tudo (e todos) os que se lhe apresentam durante tempo a mais. Falo aqui num “a mais” que tem o expressivo sentido ad nauseum.
Então, o que fazer para combater este problema? Como é natural, a única solução é mudar a mentalidade de grupo. Esta mudança gerará, por seu turno, uma mudança na legislação e uma mudança nos comportamentos. (Mudanças essas que são necessárias, porque numa sociedade dita “livre” e “liberal” a poligamia não tem qualquer cobertura legislativa: o que é que eu faço se estiver a viver em união de facto com mais do que uma pessoa?) Como já referi há pouco, não defendo haréns, em que um homem possui várias mulheres. O que eu defendo é uma liberalização dos relacionamentos (não só sexuais, claro) entre as várias pessoas. Isto geraria situações de equilíbrio e diminuiria os problemas conjugais e de relacionamentos interpessoais. Exemplifico: se dois homens estivessem interessados numa mesma mulher e esta estivesse indecisa entre um e outro, porque é que, ao invés de ter de optar, não iniciaria uma relação com cada um deles, de forma aceite e reconhecida? Ou, melhor ainda, porque não iniciariam os três uma relação? Toda a problemática do ciúme teria tendência a desaparecer, pois seria culturalmente normal que uma pessoa tivesse relações amorosas com várias pessoas, ou que várias pessoas estivesse envolvidas numa mesma relação. Não existiria traição porque as regras excluiríam o conceito, seria um conceito vazio, que nada abrangeria – ah, a beleza do conceito de relatividade dos comportamentos desviantes é esta! Por outro lado, julgo que se verificaria uma diminuição do recuso à prostituição: muitos a ela recorrem porque estão insatisfeitos com as suas relações legítimas; ora, com o alargamento de “relação legítima” (alargamento ad infinitum, no qual se entende todas as relações), o leque de possibilidades estaria muito mais alargado e permitiria, por consequência, a diminuição deste fenómeno, ou, no mínimo, dos clientes que a ele recorrem. Portanto, vários são os problemas resolvidos, encarando as coisas desta perspectiva!
Um problema surge perante este cenário de felicidade e libertação: tal esquema social iria abalar e perturbar uma venerável e antiquíssima instituição, base do funcionamento da dita sociedade, considerada um ponto de referência para quase todos e o desejo de muitos. Traduzindo: o casamento... Ah... que pena! Isso não é, de forma alguma, uma contra-argumentação! Pelo contrário, isso faz parte da argumentação. No esquema que proponho (e mesmo no já existente) que sentido faz o casamento? É a assinatura de dois nomes num papel ou uma cerimónia, quando a há, que vai alterar completamente o sentimento entre as pessoas? Precisamos ainda deste rito de passagem? Lembremo-nos que o casamento é uma instituição eminentemente religiosa; que marcava, em tempos idos, a junção de dois amados no leito conjugal, o começo de uma vida a dois, a desfloração mútua. Ora, como sabeis, isso são perfeitos disparates na actualidade – já quase ninguém espera pelo casamento para ir viver com a outra pessoa, ou sequer para iniciar a sua vida sexual! Então, para quê manter uma prática que já perdeu o seu simbolismo? Pode-se sempre dizer que representa a dedicação de uma pessoa a outra e vice-versa... Mas aí tenho de contrapor que é sob essa perspectiva que o casamento se apresenta ainda mais abominável: aquilo que está mascarado de “entrega” não passa, na realidade, de um contrato de posse de uma pessoa sobre outra e vice-versa. Ora, considerando que é razoável pensar que ninguém tem o direito de possuir outra (a escravatura, “sob todas as suas formas”, diz a Carta dos Direitos do Homem e do Cidadão, é proibida), e por isso recusei os haréns como forma de organização da vida familiar, não se compreende que se avance para um tal contrato de sorriso nos lábios. Acaso é alguém digno de possuir direitos sobre outra pessoa daquela forma? É nisto que radicam os abusos de poder dentro de uma relação: na posse que o casamento confere e é. Porque será que as feministas nunca se lembraram disto? Também elas acabam por estar normalizadas...
Assim, abulamos este vil contrato e recusemos a monogamia; eis um começo da libertação da mui degradada e antiquada mentalidade ocidental. Comecemos a pensar segundo novos moldes para, através deles e por nós, moldarmos a sociedade que somos.

Recordo que todos os comentários construtivos são apreciados. Obrigado. Para uma leitura de lazer que pode dar uma outra perspectiva sobre este assunto, e que me serviu como musa, aconselho o livro "Um estranho numa terra estranha" de Robert A. Heinlein.