segunda-feira, julho 26, 2004

Arde...

"E Portugal está a arder" - ouvia-se o ano passado, mais ou menos por esta altura. Morreram várias pessoas (os números dependem da fonte, porque houve quem tivesse conseguido reduzir drasticamente o número de mortos, não sei bem como... acho que não os ressuscitou mas nunca se sabe...).
É claro que depois de tanto incêndio e de tanta destruição, o poder político tinha de garantir que isto não se voltava a repetir. Então foram feitos projectos, tomadas medidas, iniciada a prevenção, desloqueados fundos...

E toda uma data de tretas que vêm redundar no que se vê este ano - "Portugal está a arder". É impressão minha, ou estamos perante um déjà vu? Por aqui se consegue ver a incompetência política generalizada, num assunto que é muito maior do que qualquer outro. A mim, faz-me um pouco de impressão ver que, para apoiar a preservação florestal, se fale das receitas que gera, das pessoas a quem dá trabalho, etc... Estamos a falar da nossa casa, da nossa sobrevivência biológica - quem se interessa nesse momento com dinheiro? Não conspurcámos já demasiadamente o planeta que habitamos? Agora damo-nos também ao luxo de descurar o seru tratamento e preservação!

Mas porquê? Bem, o sector da construcção civil e imobiliário está sempre a precisar de mais trabalho. E o que tem isso que ver com as florestas que sofrem? Simples: é que não é raro ver que os terrenos ardidos, depois de desvalorizados, são muitas vezes comprados por senhores que adoram dinheiro; estes, por sua vez, acabam por conseguir permissões de construção onde elas não deveriam existir. Por fim, as pessoas que vão para lá morar estão-se pouco nas tintas para o facto de onde moram agora ter sido uma floresta que foi violada por amor ao capitalismo. (A única chatice é que essas mesmas pessoas condenaram a inacção dos bombeiros, políticos e afins antes de lá morarem, e continuarão a fazê-lo depois. Este tipo de hipocrisia e falsidade, junto a um amor ao execrável politicamente correcto é base de muitos dos enganos e inacções de hoje em dia...)

Por último, as pessoas que reclamam contra o governo e que vivem em zonas arborizadas, poderiam muito bem ter ajudado à conservação dessas mesmas zonas. Delegar o trabalho e as responsabilidades é mais fácil. O que não quer dizer que a estrutura do poder não tenha a sua quota parte de responsabilidades. Deixando um sector tão importante ao deus-dará, mostra que realmente não sabe o que é importante, nem sabe lidar com o que é importante. Não sei se neste caso se trata de ineficácia ou de inacção, de não saber fazer ou de não fazer. Só sei que enquanto isto persistir, a nossa espécie está condenada a não merecer viver neste planeta. De todas as espécies, somos a única que não sabe interagir com o seu habitat porque nos julgamos acima da Natureza e não parte dela. O facto de querermos vencer a Natureza (e de o conseguirmos parcialmente) leva a que pensemos que não precisamos da Natureza, esquecendo-nos que, mau-grado a nossa programação social artificial, nós somos naturais e dependemos de factores naturais para sobreviver. A menos claro que prefiram viver como os habitantes de Tóquio, que têm bares onde pagam para inalar... oxigénio!

Prometeu